Capítulos
Quando Rafaella deu vida às primeiras coleções da Neriage, percebeu que não se via refletida nos conceitos tradicionais do mercado da moda, onde cada coleção narra uma história distinta. Para ela, suas criações são capítulos de um único livro, entrelaçando-se em uma narrativa contínua. Por isso, chamamos nossas coleções de capítulos: cada nova peça é uma extensão da anterior, uma evolução de sua essência. Explore o menu abaixo e mergulhe na nossa história, revelada através de nossos capítulos.
Capítulo 3
Lampejo
Lampejo significa um brilho súbito, uma faísca ou um clarão. Gosto de pensar na vida como vários momentos de lampejo. Eles nos fazem mudar as rotas, desviar escolhas ou mergulhar nelas. Imagino que esses momentos são o que trazem as curvas no nosso mapa e dão movimento para nossa história.
Vejo várias discussões em torno do que é prudente fazer nesse momento, o que reflete a realidade do que vivemos. É estranho falar sobre isso porque uma coisa é reflexo de seu tempo, somente muito depois. Portanto, o que as roupas devem transmitir? Que significado elas devem ter? Mostrar sonhos, realidade, refletir um novo comportamento ou resgatar coisas de um passado que nos traz algum conforto? A preocupação deveria ser mais do que nunca encontrar as verdades que permeiam nossos objetivos, nossos propósitos. E estarmos firmes ligados a eles.
Comecei a pensar nessa coleção no final do ano passado e, não, nunca tive tanto tempo para desenvolver uma. E para quem trabalha com criação, isso pode parecer uma coisa boa ou enlouquecedora. O tempo tem essa dualidade para nós. Acabei pulando uma temporada porque entendi que não era momento de lançar uma nova história, mas observar outras e entender a minha.
Desde o início senti o desejo de falar sobre o significado de Casa, do lugar que nos sentimos mais seguros. Ao mesmo tempo nos traz tantas memórias, nos faz sentir parte de um mapa de lugares e pessoas, acontecimentos que vão moldando nosso caminho e alterando nossa rota - e vão se tornando parte do que somos.
Afinal, casa não é necessariamente o lugar onde a gente mora, mas onde depositamos nossos sonhos, nossas expectativas e sobretudo onde nos encontramos com nós mesmos. E agora percebo que, mais do que nunca, esse significado tem um sentido especial num cenário onde tudo parece tão desencontrado, com todos tão preocupados com um tempo que ainda nem existe.
Muhammed Farris, primeiro e único cidadão Sírio no espaço, também teve uma impressão interessante do significado de casa. Ele disse, em entrevista ao documentário “Human Flow” do artista chinês Ai WeiWei, que quando estava suspenso na gravidade, avistando a Terra de uma perspectiva totalmente externa, todos parecíamos uma coisa só. Terras separadas por imensas faixas de água que nos conectam mais do que nos dividem. E que insanidade parece essa constante briga do ser humano pelo significado de território, quando na verdade vivemos todos juntos no mesmo espaço, dividindo as mesmas conexões.
Portanto, Casa não seria mais aquilo que a gente constrói durante a vida do que o espaço que a gente ocupa? Onde estamos, com quem estamos e o que fizemos. Um amontoado de referências dos anos 90 e de desenhos animados. De músicas dos anos 60 e roupas de avó. De machucados no joelho por correr na rua. De mudanças de cidade e de escola, e pessoas que conhecemos nesse tempo. Um mapa de onde estamos e o que fomos, porque de nada vale um passaporte se ele não te diz por onde você realmente esteve.
Lampejo tem como inspiração o livro “Minha casa é onde estou” de Igiaba Scego, onde ela conta sobre a construção de um mapa da antiga Somália onde ela vivia, e a Roma onde ela cresceu e identifica como casa.
Trabalhamos com os tons mais icônicos da Neriage, como vermelho e azul royal. Um mix de tecidos leves, acetinados e estruturados que refletem também o nosso não pertencimento a estações definidas, mas a capítulos de uma história que é transmitida através do toque e da relação com o tempo.
As bolsas e chapéus dessa coleção foram uma parceria com o MUSEU A CASA e a ACNUR. Através da FRATERNIDADE HUMANITÁRIA INTERNACIONAL cocriamos as bolsas e os chapéus com mulheres indígenas da etnia Warao, refugiadas da Venezuela. A venda dessas bolsas e chapéus terá parte do lucro revertido de volta para a causa.







